O mundo muda... pra continuar igual
Ana Vargas
Tudo começou assim: ontem algumas pessoas
foram às ruas em São Paulo e no Rio (contra seus respectivos governadores)
houve quebra-quebra, prisões e políticos dando declarações de que tudo está sob controle.
Tudo sob controle deveria significar que o
Estado continua trabalhando para manter a ordem das coisas dentro de uma
estrutura organizada e até certo ponto, funcionando de forma ‘boa’ para todos,
mas bem sabemos que não é bem assim...
Que ‘tudo’ pareça estar fervilhando e a
ponto de explodir, não só por aqui, mas em todo planeta, é uma situação que vem
num crescendo desde talvez (?) a tal primavera árabe(não sou historiadora nem socióloga, essa é uma
constatação leiga*).
Além do mais, depois do advento das redes sociais a gente
sabe que todos os anseios são compartilhados de forma mais rápida. Um desejo de
mudança – de uma estudante de primeiro grau que crie um blog ou de uma ONG que
lute pelos direitos dos animais – faz
com que mais pessoas se agreguem em torno do mesmo anseio e, no final, o desejo
de um se torna o grito de muitos.
Pois, e diante de tantas revoltas ou de
tantas novas formas de protesto – tem gente que sabe contra o quê ou contra
quem deve se revoltar, tem gente que nem sabe por que está à frente de
protestos (embora receba toda atenção da imprensa**), e a impressão final é de
que os inconformados (jovens ou não) estão mesmo dispostos a mostrar toda a sua
raiva contra tudo o que aí está: e então, sobra para todos, inclusive para a
‘dona’ grande imprensa (que merece as críticas que recebe, com certeza).
Bom, mas estou falando de protestos (um
tema cansativo, embora a coisa não tenha parado) para chegar ao assunto
principal: a ânsia por transformações no modo de gestão (digamos assim) das
estruturas do mundo, é que tem levado as pessoas às ruas, certo?
Cachorro ‘bobo’
Mas quando a gente olha para trás
(infelizmente) vê o quanto esse nosso velho mundo parece um cachorro que tenta
abocanhar o próprio rabo, e isso, desde as civilizações mais remotas. Desde o
tempo dos faraós e imperadores e reis e de todos os soberanos que detiveram o
poder e dos quais, nada resta a não ser pó.
Quanta desigualdade social desde
sempre: se ontem havia camponeses e artesãos; hoje há os professores das redes
públicas (e ‘privadas’), garis, jornalistas (desempregados
ou em subempregos como eu): todas estas profissões que estão na base da
pirâmide desde sempre.
E, enquanto vemos que os poderosos sempre
olharão para o povo*** (bem) de cima para baixo e nunca farão nada a não ser
que esse povo demonstre insatisfação ou raiva...
É nessa hora que ocorrem as erupções
sociais (como feridas que nunca fecham porque, na verdade, a ‘cura’ é sempre
superficial), guerras, protestos, marchas...E é assim que o mundo ainda parece
ser o cão que tenta abocanhar o rabo.
Bebê fofinho
Tadinho: ele é só um bebê fofo que chegou
ao mundo há (acho) duas semanas e dizem que sua foto vale ‘só’ 10,7 milhões de
euros. Seu nascimento foi tão aguardado que os ‘media’ (como se diz em
Portugal) passaram dias e noites postados de frente ao hospital. A gravidez da
mãe também foi tão ‘tão’ que provocou até o suicídio de uma moça num imbróglio
que envolveu repórteres australianos****.
Quanto sensacionalismo! Há 30 anos
também foi assim quando a avó desse bebê se casou e foi assim também quando ela
morreu.
Tudo o que a monarquia faz é notícia e
vende, mas isso você e eu estamos fartos de saber.
A imprensa precisa disso
para vender jornais e para que a publicidade lucre e anuncie nos... jornais
(essa é a lógica e até aí nada de mais).
Mas no que pensei foi no quanto o
nascimento do bebê ‘real’ também faz com que se confirmem e renasçam com vigor
(embora isso nunca tenha ‘morrido’) a certeza de que tudo o que ‘azeita’ a
máquina emperrada da civilização (desigualdade social, luta de classes,
preconceitos, poder de uns e miséria de tantos) apesar da ânsia por transformações...
parece ser algo que nunca terá fim.
Eu não sei quanto a vocês, mas acho
extremamente ridículo que ainda existam monarquias e mais ridículo ainda, que existam pessoas que
se preocupem de modo obsessivo com tudo o que acontece lá naqueles palácios
ingleses (ou espanhóis ou suecos ou japoneses)
Pessoas que endeusam reis e que acham que
um bebê (um ser humano como qualquer outro) vale mais porque é um monarca (que
coisa caquética e isso em pleno século XXI !).
Tudo na mesma como a lesma¹
Pois é, o fato é que mais um bebê real
nasceu e daqui há sei lá quantos anos, ele estará (talvez) casado e tendo
filhos e a mídia do futuro estará lá, cobrindo tudo dessa mesma forma doentia
(espero que não, mas não vejo possibilidade de que algo mude nem em longo prazo).
Penso que essa obsessão que move pessoas
comuns (do povo, da plebe) e imprensa (os escribas dos tempos dos faraós) em
torno de pessoas que detém poderes (sejam eles quais forem); enquanto a gente
sabe que essa obsessão não funciona quando se trata de (por exemplo) noticiar
sobre os tantos bebês que todos os dias são abandonados aí pelas ruas do mundo
é (mais uma vez) o sintoma de que algo nesse nosso velho mundo vai bem mal.
E eu sei o quanto isso pode soar piegas e
meloso e o quanto posso estar misturando alhos com bugalhos, o quanto estou
sendo rasa ao ignorar questões históricas que podem, certamente, explicar de modo mais correto porque o
nascimento do filho de monarca inglês vale (muito) mais do que o nascimento de
qualquer outro bebê do mundo, mas no que estou pensando é na frase que vi num
cartaz durante os protestos e na qual
estava escrito: ‘Não acredito que ainda estamos lutando por isso’.
Pois eu não acredito que ainda hoje, depois
de tantas e milhares de revoluções e lutas e mortes de tantos em variados
lugares do planeta; ainda hoje somos obrigados a ler notícias que tratam com
normalidade o fato de que a foto de um bebê ‘real’ vale mais de 10 milhões de
euros por ser esse bebê filho de um príncipe.
Eu acho tudo isso ultrapassado, bizarro e
triste.
_____________________________________________________
Sobre o escrito acima, achei algo aí na
rede:
** Procure por Sara Winter e Femen e você
vai entender;
***Nesse link de um jornal português os
comentários dos leitores sobre o nascimento do bebê (entre outras coisas) são muito
melhores do que o texto do cronista http://expresso.sapo.pt/ha-que-adorar-o-bebe-real-e-o-papa-chico=f822282#ixzz2adj1CCxM
. Foi de lá que retirei esse gracioso título
¹;
Geraes de Minas
MINAS É NOTÍCIA. ONDE?
Paulo
R. Santos
Eu também quero morar nas notícias de Minas, andam dizendo.
E não é pra menos. Pelas matérias pagas pelos governantes tudo parece ir muito
bem. O 'choque de gestão' do Governador deixou todo mundo em choque até hoje.
O
que diria Nicolau Maquiavel se estivesse por aqui assistindo a toda essa
bandalheira?
Fazer política tornou-se – mais que antes -, a arte de
mentir com um sorriso no rosto. Hipocrisia é seu sinônimo. As promessas que
jamais serão cumpridas dão cor à pílula que os ingênuos tomam a cada eleição,
na esperança de que algo mude. Não muda! Alguém percebeu que o Legislativo
brasileiro foi privatizado na primeira gestão de Fernando Henrique Cardoso?
O lado mais asqueroso da política atual é que tornou-se
ainda mas vitalícia e hereditária. As oligarquias municipais, das pequenas às
grandes cidades, se reproduzem até o nível federal. O Brasil tem donos, e não
são muitos. E o povo? Ora, o povo … Povo é multidão de ninguém disse Nelson
Rodrigues. Voltamos ao 'Velho Regime' e a nobreza de terno e gravata está por
aí.
Maquiavel: só ele 'explica' o reino fantasioso no qual Minas se encontra... (Crédito: pintura do artista Santi di Tito (1563-1603) Imagem licenciada segundo o Wikimedia Commons) |
Enquanto Rio de Janeiro e São Paulo vivem suas guerras
urbanas, parece que Minas está na santa paz de Deus. Não é verdade. Quanto mais
apertam o cerco contra o crime organizado nos estados citados, mais eles fogem
(ou tiram férias) pra Minas. Nossas pequenas cidades estão presenciando crimes
horrendos, daqueles que são praticados por gente que já perdeu completamente o
senso. Vida não tem valor.
E as manifestações populares? Deram um susto nos políticos,
mas eles – espertamente – atenderam a algumas reivindicações acessórias e vão
adiando o essencial. Mas não convém acreditar que o fogo apagou. A presença do
Papa, o pão, o circo, o futebol e as disputas religiosas fazem parte do jogo. Por
baixo das cinzas brasas ainda queimam!
Minas aparece no noticiário quase como um oásis de estado em
estado de graça! Para quem exerce controle com mão de ferro sobre a mídia fica
fácil mentir. Noticia-se o que se quer, o que convém, e esconde-se as más notícias.
Nossas elites, conhecidas internacionalmente pelo egoísmo e burrice, acham que
repressão policial vai resolver o problema. Na verdade, estão apenas alimentado
o fogo que ainda queima por baixo das brasas. Novos incêndios vêm por aí!
Entender a política brasileira é difícil? Nem tanto! Basta
lembrar da herança colonial ainda tão presente em nosso cotidiano. A
Casa-grande, onde mora o latifundiário com sua família, dono do gado humano
guardado na Senzala e dos agregados em volta. Pense nos elementos da Senzala
que sequer desapareceram de nossa arquitetura.
Ainda existem entrada de serviço e entrada social. O 'quarto
da empregada' é um remanescente da senzala. A elite branca grita pela falta de
'domésticas'. Pagar salário é um favor e não um dever na cabeça da maioria dos
patrões. Alguém acredita que se destrói uma estrutura cultural de mais de
trezentos anos com uma ou outra penada?
Minas tem tudo isso e muito mais. Um estado que preservou
muito dessa era colonial, nas boas e más tradições. Os coronéis do sertão ainda
estão por aí, e o terno e gravata não lhes esconde o comportamento. A polícia é
herdeira do jagunço e do capitão-do-mato. Minas é notícia, mas só no que
convém. Passa da hora de contar a verdadeira história desse estado.
(Paulo R. Santos é sociólogo)
Amenidades
E, pra quem nunca viu geada, resolvi postar estas
'fotitas' tiradas por aqui, bem cedo:
Um comentário:
O mundo muda, mas a essência do ser humano não. Veja que, no fundo, a maioria é como o cachorro da foto, que corre atrás do próprio rabo. De verdade, o que essa maioria quer é estar na frente, no topo, é ser o primeiro, o que ganha mais, o mais... é estar no lugar do príncipe e da princesa, do rei e da rainha...Em alguns lugares, talvez, isso fique mais evidente, como no caso no "velho estadão", por isso essa necessidade de colocar a empregada em seu "devido lugar", mesmo que não tenha, como acontece, normalmente, condições de pagar para que ela fique lá.
Enfim, o que quero dizer, eu acho, congênito ou hereditário, temos a hipocrisia correndo em nossas veias: do pobre que bajula o rico ao rico que explora o pobre...
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