segunda-feira, 19 de novembro de 2012

“Observadores”: um país (visto por dentro) em imagens




Ana Claudia Vargas


“Uma fotografia não vale mil palavras, mas vale mil perguntas.” 

Allan Sekula



Revelar um país por meio de imagens fotográficas feitas desde a década de 1930 até os dias atuais: esse é o mote da exposição “Observadores” que fica em cartaz no Sesi-SP até o dia 25 de novembro.
Dizer que é uma viagem pela Grã-Bretanha é um clichê, então eu prefiro dizer que é uma viagem ‘por dentro’ da Grã-Bretanha, por paisagens pouco mostradas, pessoas pouco lembradas, por variadas situações cotidianas que estão longe (felizmente) do que é mostrado em propagandas turísticas.

Shirley Baker - Manchester - 1965*


É partindo dessa visão pouco comum, portanto, que vamos conhecendo a Inglaterra através do rosto sofrido e resignado de pessoas que tiveram suas casas destruídas durante os bombardeios ocorridos entre 1939 e 1945, dos jovens que moravam no interior do país  durante as décadas de 1960 e 1970 e deixaram eternizadas expressões de alegria ou certa indiferença e alguma rebeldia.


Ida Kar - Um inglês 'típico'.*

As cinco crianças negras sentadas na calçada (serão da mesma família?) numa fotografia feita por Shirley Baker, em 1965, nos fazem lembrar aquele tempo da infância que todos nós vivemos: um tempo de despreocupada alegria (embora a carinha enfezada da caçula também nos lembre que nem tudo na infância são flores).



Humphrey Spencer - Washing Day*

Os lugares retratados na maioria das fotos não é nenhum desses que vemos quando se mostra a Inglaterra vitoriosa, pujante e/ou coberta daquele falso glamour dos lugares modernos ou muito iluminados.
Os fotógrafos da mostra – Paul Nash; Raymond Morre, Ian Berry, George Rodger, Nigel Henderson, entre muitos outros – preocuparam-se em mostrar imagens que suscitam perguntas (como bem lembra a citação do começo desse texto) e não que ofereçam respostas. É certo que eles parecem querer provocar a reflexão e o questionamento.

Derek Ridgers - Babs Soho - 1987*

Sobre isso é melhor citar um trecho do folheto para definir com mais precisão o tipo de fotografia presente na mostra que é chamada com justiça de “Uma antropologia de nós mesmos”: Vamos lá:

“ Foi somente na década de 1930(...) que a idéia de uma ‘fotografia moderna’ ganhou corpo. (...)Em um período de profunda divisão social e ideológica, com a depressão econômica e conflitos políticos internacionais levando o mundo mais uma vez em direção à guerra, a atenção estava voltada para as pessoas e  para a maneira como elas viviam. Revistas e jornais criaram uma nova demanda para as fotos e para as histórias ilustradas. Artistas, escritores e pensadores, particularmente os de esquerda, abraçaram temas sociais e um novo realismo, numa tentativa de compreender e retratar a sociedade britânica com nova objetividade e imparcialidade científica: para se engajarem em uma  ‘antropologia de nós mesmos’. Um debate entre o Realismo e o Surrealismo atravessou a década de  1930. Inúmeros fotógrafos, voltando suas lentes  para sujeitos sociais desconhecidos, percebiam a realidade como surreal, estranha. Como muitos descobriram, a verdade podia ser mais estranha que a ficção”.

Pois é partindo dessa premissa que estes fotógrafos adentram os subúrbios londrinos nos quais moram em humildes sobrados geminados, operários que possuem numerosos filhos; e passeiam por paisagens do interior do país mostrando piqueniques coletivos nos quais se junta uma diversidade de pessoas e culturas que parecem simbolizar - ainda e apesar de tudo – a esperança de que povos de diferentes raças e culturas vivam em paz.

Paul Trevor - Liverpool *

Proletários ou elegantes, simplórios ou sofisticados; com aquelas caras tipicamente inglesas de velhos senhores e senhoras que devem sim, tomar chá às cinco da tarde (ou não); jovens suburbanos com posturas rebeldes vestindo jaquetas de couro e com os cabelos raspados (essa, a imagem mais corriqueira quando se pensa em ‘juventude britânica’) ou moças  de rostos sonhadores e ares singelos – fotografadas por Daniel Meadows -  destoando do que se poderia esperar de mulheres inglesas do começo da década de 1970: tudo isso compõe um rico mosaico de imagens que nos deixam com o desejo de conhecer estes lugares e principalmente, aquelas pessoas, embora saibamos que hoje tudo está mudado (pessoas, lugares e os tempos nos quais se situavam).

Daniel Meadows - Jovens ingleses - 1974*

Destruindo mitos pré-fabricados e talvez, construindo outros; revelando paisagens sociais e humanas de um país para além do que nos acostumamos a ver quase sempre, a mostra “Observadores’ oferece a possibilidade de conhecer a Grã-Bretanha caminhando por trilhas e estradas pouco frequentadas, adentrando desde salas de casas pobres até as famigeradas salas de espera de órgãos públicos – essas são deprimentes em qualquer lugar, como se descobre -  passando por escritórios ou  quintais e clubes campestres nos quais os britânicos perdem a pose e se agarram felizes, conformados ou abertamente despudorados, à vida: é assim que essa mostra cumpre com louvor o seu (ou um dos) papel de exibir uma “antropologia fotográfica” da Grã-Bretanha.

Para terminar é importante dizer que a mostra “Observadores” faz parte de um projeto do professor de artes, João Kulcsár,  e que tudo começou na década de 1990, quando ele foi bolsista do British Council . A mostra é também apenas parte de outro projeto, mais amplo, que utiliza a fotografia como forma de criar nos jovens (e professores) a capacidade de analisar criticamente a sociedade.

* Fonte de todas as fotos: Alfabetização Visual 

Para saber mais sobre a mostra e sobre esse projeto, visite:

Seção Geraes de Minas

Hoje a seção Geraes de Minas apresenta um belo poema do novo colaborador (espero) oficial, Lázaro Barreto, que descreve no poema abaixo os muitos e poéticos nomes de algumas cidades, lugarejos, povoados, enfim, dos tantos cantos desse imenso 'país' chamado Minas Gerais. Aproveito para agradecer - publicamente - ao Lázaro e dizer que suas contribuições serão sempre muito bem vindas.


Toponímia dos Campos e das Minas Gerais 
Lázaro Barreto.


                                                                    

                                                                    Cabeceira do Buriti

                                                                      Brejo dos Mártires

                                                                    Córrego dos Nobres

                                                                          Água Emendada 

                                                                  Chapada das Perdizes

                                                                          Onça de Pitangui

                                                                              Sapucaí-Mirim
 
Abre Campos,  Passa Vinte Velho,  Barra da Cega,  Borda Mata

Campo do Meio, Catas Altas da Noruega, Pinta-Pau, Rio Espera

Cava de Fora,  Curralinho de Dentro, Soca-Pó, Sombra da Tarde

Juiz de Fora, Mãe dos Homens, Penha do Capim, Fecho do Funil

São Sebastião das Três Orelhas, Quem-Quem, Palmeiras de Fora

Santa Rita  de Pacas,  Quebra Viola,   Pedra Menina,  Quenta-Sol

Divino do Canivete,   Três Corações,  Volta Bala,   Cana do Reino

Cajuru do Cervo, Três Pontas, Vargem do Paga Bem, Venda Nova

Caracóis de Cima,  Nova Serrana,  Mata do Sino, Gambá de Baixo

Belo Horizonte

Cocais da Estrela

Seio de Abraão

Guarda dos Ferreiros

Senhora dos Remédios

Dores do Indaiá

Acaba Mundo.




Seção "Paulistânia" 

Hoje estou inaugurando uma nova seção, esta a 'Paulistânia', assim sempre que houver alguma razão para falar de São Paulo - seja ela boa, ruim, crônica, notícia, música, gente, fotografia e etc. - postarei aqui. A vontade de criá-la já existia e hoje 'vai ao ar' porque, para além de tudo de ruim que tem acontecido aqui, essa (ainda) é uma cidade que oferece imagens bonitas como essas abaixo (a qualidade das fotos não é boa: foram tiradas com celular). No sábado, fui com uma amiga ao Centro Cultural São Paulo para visitar uma exposição (claro) de fotografia e andando por lá (aliás, frequento o centro cultural desde que vim morar aqui, há 20 anos,  e sempre me encantei com a arquitetura aberta e iluminada de sua estrutura) me deparei com uma cena inusitada. Sob o teto (?) do prédio - que tem bem no centro, um jardim com árvores enormes - como num jardim suspenso, várias pessoas tomavam sol, conversavam e observavam a paisagem. Parecia cenário daqueles quadros do Renoir, no qual as pessoas se alegram às margens de lagos, mas era essa cidade aqui mesmo: tão violenta (conforme a mídia alardeia), tão contraditória e, nesse caso, tão (alegremente) surpreendente. Então, se você 'pensa' que São Paulo é 'só' violência, PCC e 25 de março, está enganado. 
Pode vir passear aqui sem medo, ok? rs

Nos jardins suspensos do CCSP as pessoas...






...apreciavam a tarde de sábado...














...e me faziam pensar que essa cidade é mesmo surpreendente.









3 comentários:

Ana González disse...

Lindas fotos, e comentários que nos lembram coisas importantes de nossa cidade. Obrigada, querida.

Anamaria disse...

São Paulo é uma cidade muito interessante: encanta ao mesmo tempo que amedronta. Há tanta coisa bonita pra se ver, pra ser admirada, mas...
Talvez a gente não devesse se deixar intimidar tanto e procurar enxergar mais o que é belo do que as coisas ruins (essas existem em todas as outras cidades do mundo, um pouco mais, um pouco menos). Esta sua matéria nos "desperta" para esse outro modo de ver.

Anamaria disse...

Muito interessante também o poema de Lázaro Barreto - Dores do Indaiá é, quase, o ponto final, o fim da linha - ops, do poema!